quinta-feira, 5 de novembro de 2009

MARGINAL



A retina captura a luz do teu olhar.
Te ver à mostra, me encanta.
A covinha ao lado do sorriso,
Lindo, branco, perfeitos lábios,
iluminada alegria de viver.
A beleza da pele, lisinha,
o umbigo, redondinho
na barriga durinha.
Que mirada de esguelha!
O que te dá na telha!?,
quando você vem se mostrar,
cheio de atitude,
e tantas virtudes,
para minha total beatitude!
Vai encarar?!
Mexe comigo,
bole que não é mole.
Passa e repassa,
me deixa sem graça com teu assédio,
espanta o tédio de ser eu,
Que de tantos modos quero te ver que nem é de bom tom que fique te encarando afinal nem fomos apresentados formalmente, nem pertencemos ao mesmo círculo de amizades e nosso encontro, fortuito, totalmente ao acaso, escusados destinos ou desatino do tino, se há de se repetir, senão, será hoje somente aqui e agora, ao piscar terei deixado passar sem guardar, arsenal, depósito, memória, quem sabe inglória história, talvez nunca mais nos vejamos com os olhos que nos encantou hoje e nem haverão interpretações das impressões que de você me permito:
Mito tatuado, estonteante, escandaloso, desmesurado de incertos absurdos contornos, tangentes marginadas, imaginadas em mundos marginais, facções, falanges, sílabas, sinais, tribais, tramas, mapeando a pele, Apolo alegórico, fábula figurada de animais e seres inanimados, dragões, leões, sereias, serpentes, tigres, touros, Teseu e o minotauro, Ulisses, argonauta marujando mares a navegar, portos fundeados, terras exóticas a conquistar, anjo gravitado, águias gravadas às agulhadas no flanco dorsal direito, peitorais estampados com o que deveriam ser capazes de enfrentar, tempestades, furacões e todas as ilusões de um parque de diversões, Hermes a se mover no ar pronto para amar, Aquiles de calcanhares cravados na terra sem ousar transpor a barreira, tendo vertigens à beira, nem ir às origens, ou a Órion, fundeados à orla,... mesmo assim,
Moleque abusado,
de musculatura túrgida e coxas torneadas,
tratadas à ferros,
anabolisado por meu olhar,
cria uma só imagem, visagem.
Na viagem voraz que faço,
como um pouco de cada,
tão belos, todos, cada qual a seu modo.
E eles vêem, são muitos, serafins, delfins míticos em constelação estelar,
orbitando voejam, deixam que eu veja, se mostram, se expõem.
Júbilo opiado,
bomba o bumbo da bateria, bombeia o sangue, aflui energia infinita, alimenta o espírito,
colírico deliro onírico!
Mareado, meneio marimbondos,
mirando a maneira beleza, viva, escultórica, jovem, sem retórica, masculina,
mostrada quase despida, despudorada, dourada,
deuses,
de sunga,
desfilando à beira-mar,
domingo.

sábado, 17 de outubro de 2009

DIFERENÇAS



Como queria que as mínimas diferenças que venho notando no comportamento do meu companheiro compusessem um momento a parte e não fizessem parte do que pressinto ao notar coisas anormais nas mais leves atitudes ou antes virtudes como querer
encochá-lo e ser repelido no revirado do sono e a pretexto do pretenso calor calado sair da cama expelido suspirando comprido para ir tomar um ar na varanda varando a clarear a madrugada fria filetando de luz o ar como um farol alumiando o breu abrindo clarões indo e vindo de um lado para o outro fumando um cigarro aceso na guimba do anterior atraindo o vício que outrora abortara como se prisioneiro em fuga beirasse um precipício na indecisão de alçar vôo precipitando-se pelo beiral de braços abertos no breve vazio espaço entre prédios perdendo preciosos segundos de carinho no caminho
demorado ao voltar ao aconchego chamando em sonhos um estranho cujo nome se enreda entre as dobras dos lençóis e some feito fantasma que se evade desfeito na luz da alvorada como o perfume que se ala volátil veloz desprendido da memória olfativa frívola mas persiste ao voltar insistido no rever pôr instantes a imagem amorosa da boca retribuindo um beijo



no inesperado abraço segurando o corpo do outro durante o ato desmedido metida língua a dentro dando ciência e seqüência ao ensejo de serem um só corpo corporificando em gloria o fato de poderem estar juntos e exercerem o direito de serem felizes pôr se terem como amantes amigos amparados no abrigo construído em conjunto puxando assuntos pertinentes ou se fazendo impertinente provocando risos sendo raso ao repetir obscenidades de rareada zanga zangão zagueiro nada esconde nem se esgueira tudo trás as claras cara de poucos amigos aos comprometidos exercícios diários rosário desfiado de incontáveis abdominais abominando as intermináveis corridas na esteira estirando músculos pôr quilômetros sem sair do lugar tudo para abrigar um corpo saudável ou uma aparência que deixe seu parceiro orgulhoso guloso ao comer marshmallows melando os dedos na gula das noites de gala dois galos bebendo no gargalo dois falos firmes falando forte você é meu eu te amo meu macho e se achando inteiros ao se terem tomam-se plenos tramando pernas palmos de planos passíveis de futuro e só isto bastaria para que a noite parasse e que a certeza daquilo que você teria pra me dizer estancasse e não soasse e de nossas bocas sussurrantes saíssem apenas sons do amor correspondido comprometidos ditos de louvor mas agora esgotado o ato farejo no ar arfado que pelo furo entrevisto na disfarçada presença ausente faz sentir que por trás do rosto outro gosto se abriga brigando com a face escondida pela máscara como se a casca fosse a verdadeira cara do cara culta séria sisuda que diz tudo o que a de trás traz estampada estática estratificada caduca oculta o amigo o amante o irmão a alma gêmea que me fez gemer entre gozos como se últimos fossem fazendo satisfazer os desejos de um condenado apenado à morte já próxima a execução final e afinal o que houve ouça se calas consentes em um novo consórcio um outro conluio perjurando as juras puras assentidas mesmo não assinadas assassinando o compromisso sendo permissivo com o alheio pôr quem sabe apenas um enleio de corpos um simples carpe diem dando margem para que a mágoa se instale nublando aquilo que foi fazendo fustigar com o látego da dúvida a lógica da certeza do que fomos somos fórmula comprovada dádiva dada a apenas alguns seres abençoados abraçados pôr vontade própria e ajuntados no intento de sermos todo complementos e que os momentos que vivemos serão nossos pela eternidade atestado a raridade do sentimento no instante em que estamos aparentemente nos separando soprando para longe o perto o próximo provocando a dissensão a dissolução do acordo nos acordando para a realidade a verdade de que a partir de agora somos não mais nós apenas sós.

domingo, 11 de outubro de 2009

NA ESTRADA



Merlin seguindo a frente é tudo o mais são indistintos contornos no nevoeiro virando chuva fininha e um terrível frio infiltrando ossos e viv’alma se move senão farpas farrapos apenados apelando luz no breu breve vem a aurora aquela hora em que ainda o entorno é silêncio e apreensão prestes a explodir em vida que agora parece exaurida exercido o negror em que tudo assume proporções desmedidas à ausência de parâmetros pela imaginação exacerbada preparada para um provável encontro com demônios que vagam a procura de uma brecha entre mundos entre a luz e a escuridão donde se evadem para penetrar corações distraídos invadindo relações criando confusões armando situações limite e no limite das forças forçando para chegarmos a um destino em desatino empreendida viagem sem a devida bagagem nem armas com que nos defender em caso de ataque e vai saber que impulso nos fez estar na estrada longe de qualquer ermida que nos possa dar acolhida quando as sombras mais se espessam espectrando tudo que cada passo pode ser o derradeiro pois beiramos terreiros de precipícios tenebrosos umbrais trevosos onde a vida nada vale mas vale saber que Marlin parece ter a exata noção de onde pretende chegar me arrastando assim pôr vales abissais como se caminhasse na nave de uma catedral banhada pela luz Divina e guiado pôr cânticos angélicos até um altar onde receberá a comunhão que o livrará de todo o mal aliás dá a entender pela determinação e leveza com que anda que pelo mesmo motivo o mal que a mim aflige tingindo terríveis cenas na imaginação a ele já não atinge tangenciando uma aléia em íngreme ladeira damos com a porta de um provável pouso onde nos pomos a bater na intenção de que alguém nos receba e nos conceda abrigo das inclementes intempéries que nos enregela os membros cansados famintos somos convidados a entrar destravadas as aldravas do enorme portão portanto estamos a salvo dos perigos da noite mesmo que não saibamos em que antro de ladrões adentramos de boa fé fazendo mesuras o mestre da casa nos conduz a mesa que parece estar posta a nossa espera alumiada pôr lamparina a refeição fumegante parecendo extremamente apetitosa dada tremenda fome faz salivar as línguas largamos o corpo sentando Marlin e eu e nem reparamos nos outros convivas que aparentemente não tem interesse pôr nós nos entretemos devorando o pernil de um cabrito assado pão queijo e vinho fazendo efeito amolecendo membros ambos bambos somos conduzidos a alcova arranjada com esmero como se fosse receber o príncipe do reino e meu reino pôr uma cama onde derrubar meu corpo em estado lastimável e o estimado estalajadeiro nosso hospedeiro faz menção de oferecer como obséquio séquito na intenção da sedução dos sentidos mas pôr muito entorpecidos declinamos travando a porta com a tranca nos metemos nas cobertas e sem demora entramos nos braços um do outro trocando hálito a vinho cebola alho e mesmo assim como estamos entregamos nosso calor ao bem vindo sono que nos acolhe colhendo nos sonhos réstias de sol de paradisíacas ilhas onde nos banhamos nus nadando em mares esmeraldinos de águas mornas e transparentes enchendo nossos corações de cálida ternura e uma quentura nos faz despertar em brasa abraçando mais o parceiro passando pernas entre pernas permitindo penetrar a intimidade a umidade dando resvalo para o falo em riste rente no orifício apertado fazendo gemer de dor e prazer passando línguas pelas peles ligando mundos mágicos aos físicos carentes de calor e toques de senso sem sensu só sendo sensações satisfazendo a ânsia de aprofundarmos almas a urgência de acalmarmos a chama que nos chama um pro outro ao que chamamos amor murmurando ao ouvido coisas que dizemos somente nesta hora em que oramos em uníssono sons somente inteligíveis à língua dos anjos agindo como loucos lúbricos lidamos com nosso lado demônio damos prova do sabor do outro autorgamos ao outro a satisfação dos nossos desejos ensejamos fazer o que não sabemos o que o outro sente sentimos muito prazer em prezar a felicidade que perpassa enquanto passamos a mão com a intenção do coração criando intimidade tal que nem pensamento entra no momento em que tudo perde a lógica e vira música ritmo vibração ação e reação cães raivosos rosnando no cio ciciando criando um entendimento que ultrapassa assa coze costura mundos e fundos funde fode faz assim sim gemendo vai vamos vazamos damos as mãos dois amados desarmamos armas acalmamos calamos chamamos o sono sumimos no sonho somos outra vez meninos brincando de cavaleiros andantes pôr estradas que vão dar no castelo onde moram reis e rainhas de reinos a serem conquistados.

quinta-feira, 1 de outubro de 2009

BOLADO



Balas trocadas
Truncadas bolas bolei
Bocó da mola calei
Saí sem coió na cola
Colei no vácuo

Carente de fundos
Arrombei o cofre

Bacana fui pro samba
Me achando bamba
Bombado bailei

Bomba! Bomba:
Descolei um bofe

Faminto de amor
Babei
Boquejando o microfone
Cantei uma estrofe uma ária várias
Mermão isto me consome mas é só tesão

De bode amarguei uma bad
Cortei um dobrado
Credo em cruz bradei aos céus
Cruzei Crises
Dancei lundu maracatu e corta jaca
Meti o pé briguei de faca de foice
Aos coices
Nem convém descrever
Voices from além
Pra reverter a pendenga
Foi uma arenga

Tendo armado a contenda
Compreendi
Pedi pra voltar
Quero de novo casar

terça-feira, 29 de setembro de 2009

GENET




Diante de Robert, Nonô retomava sua verdadeira virilidade, que perdia um pouco com Querelle. Não que ele tenha adotado a alma ou os gestos de um veado, mas perto de Querelle, parando de considerar um homem que gosta de mulheres, banhava-se na atmosfera especial que sempre suscita um homem que gosta de homens. Entre eles, apenas para eles, estabelecia-se um universo (com suas leis e relações secretas, invisíveis) onde a idéia da mulher estava banida. No momento do gozo, um pouco de ternura perturbara a relação entre os dois machos - sobretudo em relação ao patrão. Ternura não é a palavra certa, mas explica melhor a mistura de gratidão em relação ao corpo de onde se tira o prazer, de doçura que nos funde quando o prazer escorre, de lassitude física, mesmo de nojo que nos afoga e alivia, que nos afunda e nos faz vagar, de tristeza enfim; e essa pobre ternura, emitida um pouco como um raio cinzento e doce, continua a alterar delicadamente os simples relacionamentos físicos entre machos. Não que estes se tornem algo que se aproxime do verdadeiro amor entre homem e mulher ou entre dois seres onde um deles é feminino; mas a ausência de mulher nesse universo obriga os dois machos a extraírem de si um pouco de feminilidade. A inventar a mulher. Não é o mais fraco ou o mais jovem, ou ainda o mais delicado que realiza melhor essa operação, e sim o mais hábil que com freqüência é o mais forte e mais velho. Uma cumplicidade une os dois homens, mas nascida da ausência da mulher, essa cumplicidade suscita a mulher que os une pela sua falta. Na relação deles, a respeito disso, nenhum fingimento, nenhuma necessidade de ser outra coisa além do que eles eram: dois machos, muito viris, que se invejam talvez, se odeiam mas não se amam.

JEAN GENET

GEnet




Diante de Robert, Nonô retomava sua verdadeira virilidade, que perdia um pouco com Querelle. Não que ele tenha adotado a alma ou os gestos de um veado, mas perto de Querelle, parando de considerar um homem que gosta de mulheres, banhava-se na atmosfera especial que sempre suscita um homem que gosta de homens. Entre eles, apenas para eles, estabelecia-se um universo (com suas leis e relações secretas, invisíveis) onde a idéia da mulher estava banida. No momento do gozo, um pouco de ternura perturbara a relação entre os dois machos - sobretudo em relação ao patrão. Ternura não é a palavra certa, mas explica melhor a mistura de gratidão em relação ao corpo de onde se tira o prazer, de doçura que nos funde quando o prazer escorre, de lassitude física, mesmo de nojo que nos afoga e alivia, que nos afunda e nos faz vagar, de tristeza enfim; e essa pobre ternura, emitida um pouco como um raio cinzento e doce, continua a alterar delicadamente os simples relacionamentos físicos entre machos. Não que estes se tornem algo que se aproxime do verdadeiro amor entre homem e mulher ou entre dois seres onde um deles é feminino; mas a ausência de mulher nesse universo obriga os dois machos a extraírem de si um pouco de feminilidade. A inventar a mulher. Não é o mais fraco ou o mais jovem, ou ainda o mais delicado que realiza melhor essa operação, e sim o mais hábil que com freqüência é o mais forte e mais velho. Uma cumplicidade une os dois homens, mas nascida da ausência da mulher, essa cumplicidade suscita a mulher que os une pela sua falta. Na relação deles, a respeito disso, nenhum fingimento, nenhuma necessidade de ser outra coisa além do que eles eram: dois machos, muito viris, que se invejam talvez, se odeiam mas não se amam.

JEAN GENET


quinta-feira, 10 de setembro de 2009

FUGA




Fugindo da matilha que vem em meu encalço, refugio-me em fortaleza, meu silêncio, como em cidadela, para nela recompor as forças,preparar estratégia, avaliar as condições que ainda tenho a mão para empreender uma retirada, já que o embate é inevitável e pelo visto redundará em estrepitosa perda e total prejuízo. Que falta de juízo, aventa o pensamento que momento embaraçoso e quão saboroso foi antes da precipitada derrocada, que virada do destino, em que drama latino se transformou o belo enleio, sem afinal dizer ao que veio, o que poderia ser a trama de duas almas, agora é preciso calma para desfazer a quizila que fervilha na desparatada aparente lama e, dizer que a ama foi a culpada, coitada, tão somente ciente, crente que estava ajudando, comprovando com seu silêncio o quanto aprova, se mais prova não fornece, daquilo que sabe, porquê viu ou escutou, rumorado, porque não era coisa para ser falada assim em voz alta, propalada aos quatro ventos, tome tento, falta pugnada com corda ou lâmina, ou pior, fogueira, ânima de quem ama, beira da paixão, quando tudo extravasa e não reza a razão, e o que se quer é viver o enleio enlevado do momento sem que outro pensamento entrave, o ter a fugidia ave, naquele instante, luzidia glória celestial, ou bestial instinto, se não minto o que sinto, trazendo esto estival, que afinal não sou de ferro, e se por acaso berrar clemência, se deve a urgência de expor o horror do vazio de não ter com quem contar, nesta ingrata hora, quando tudo me deixa de fora, exilado do convívio, até com certo alívio, pois sentia exaurindo, tal eurritmia, já procurando eutimia no benvindo indiferente lasso braço de depois de consumado o fato, faustoso, por si só ledoso, mas que afinal descompõe, depõe, se persiste, insiste em redundar e só o ato, magnífico em si, compensa a coragem de participar de uma tragédia, o valor da verdade e por fim o perdão, se houverem, me redimirão, trazendo alento a este momento, em que já me faltam forças para seguir adiante, levar avante a evasão, correr estrada a fora com cães a farejar os calcanhares, fraquejar, apesar dos pesares sinto que ainda não está findo o impasse, ainda que imposto, não aceito, lindo, posto no leito, pesando no peito, no ponto de abate, quando bate na porta o pai, ai que vexame o exame, corta barato, porque, de fato, teria saído à francesa já tendo comido a saborosa fruta feita sobremesa.

terça-feira, 8 de setembro de 2009

A SOCIEDADE SECRETA




Michel Foucault disse que a promiscuidade no homossexualismo masculino é o resultado da repressão ao homossexualismo e, em particular, do namoro. Não foi possível desenvolver uma cultura de namoro – observa - porque havia a necessidade de esconder e a urgência de concluir. A consciência homossexual - observa ele – inclui o conhecimento de saber-se membro de um grupo social particular. Este assumiu a forma de “filiação a uma espécie de sociedade secreta, ou de participação de uma raça maldita, ou ainda de pertencer a um bloco da humanidade ao mesmo tempo privilegiado e perseguido”. Na definição dada pôr Roland Barthes: “Uma deusa, uma figura digna de ser invocada, um caminho de intercessão”. Uma comunidade onde se entra pôr revelação e iniciação. ... em primeiro lugar está a solidariedade coletiva com seus direitos e deveres, com seu comunismo erótico e então, somente então, delineiam-se as individualidades, as amizades profundas, até se chegar ao exclusivismo amoroso do enamoramento.
No ensaio “Caro Paul”, de Paul Robinson, um professor leva um aluno a reconhecer a própria homossexualidade. O aluno lhe diz que se apaixonara pelo companheiro de quarto e sofrera uma grave desilusão. O professor lhe explica que errou ao procurar imediatamente o amor. De fato, no mundo gay, o sexo vem antes do amor. A estrutura da vida gay exige que se ponha de lado o romantismo, que se freqüentem determinados bares, que se façam experiências eróticas quase impessoais. O aluno, portanto, deve antes de mais nada reconhecer em si a vocação, o “chamado” homossexual. Depois, quando já estiver certo, deve ingressar na vida gay aceitando suas regras de promiscuidade. Somente depois de muito tempo poderá realizar também uma experiência de amor individual, romântico. Francesco Alberoni

quinta-feira, 3 de setembro de 2009

IGUAIS




Essa estória aconteceu no tempo em que ele era apenas um garotão, cheio de sonhos, planos, decisões, um mundo a conquistar, fazendo o quinto período da faculdade de administração, à noite, trabalhando durante o dia numa multinacional como auxiliar administrativo, e não tinha tempo de encontrar ninguém para ter um relacionamento, vivia de casa para o trabalho, a faculdade de volta à casa, estudava em todo o momento livre, queria progredir, subir na vida, ser alguém, tudo o que ganhava, economizava.
Para voltar para casa, depois das aulas, tomava um ônibus. Vinte e duas e quarenta e cinco. O estômago, roído, ruindo, ruinado, roncando, reclamando. Dois estudantes mais no ponto. Veio o ônibus. Subiu, pagou ao trocador, só um banco vago. Nele, um cara, inacreditável, a mesma cara. Era ele sentado ali. Igual a ele. Um sósia. Um outro ele, como ele mesmo nunca tinha se visto.
Recostada a cabeça, no encosto do banco, de olhos fechados, segurando uma mochila no colo, dormitava.
Quando sentou, o outro se movimentou, encolheu, ajeitando-se no banco, deixando livre o espaço, que a ele cabia.
Ao acomodar-se, uma forte corrente elétrica percorreu os corpos. Colaram, como siameses. Quem olhasse de frente, diria: gêmeos, idênticos. Mas não eram, não se conheciam, nunca se tinham visto.
Surpreendido, o outro, despertado, pondo-se em atenção, virou o rosto olhando-o nos olhos, como no espelho, a imagem que viram era a de todo dia ao escovar os dentes, pentear o cabelo, fazer a barba, a cor, a forma do rosto a mesma fôrma, sem tirar nem pôr.
Quem é você? Perguntaram-se sem perguntar. Sem poder responder.
Voltaram a olhar para a frente, encabulados, surpreendidos, aturdidos, atônitos, incrédulos, do que os sentidos tinham visto, vistoriando pôr dentro dos olhos fechados, a surpresa de se enxergar sentado ao lado no banco do coletivo.
Sem coragem de voltar a encarar cara a cara, ficaram calados, colados, grudados lado a lado. Mas o corpo, reagindo, sentido a inevitabilidade do encontro, se encontrava, com faíscas de eletricidade estática, ondas de calor, indo e voltando de um para outro, não os deixando negar que a perturbadora proximidade os fazia vibrar em uníssono, deixando-os submissos aos sentidos.
As narinas dilatadas, como animais em estado de alerta, o pelo eriçado, pressentindo o perigo, farejando um ao outro, medindo intenções, avaliando, considerando movimentos, prontos ao ataque.
Sem se dar conta, contato, um toque, tato, mão na mão, um esbarrão. Uma forte ereção. Situação inusitada, nunca antecipada, jamais imaginada. Outra olhada, encabulada, encantada. Que fazer na situação, a ereção, a atração? Se ver no outro, sentir-se fundindo-se ao outro, por todos os poros, as moléculas girando em ondas, de infinitas idas e voltas, vórtices de energia tornando-os um só, sentados lado a lado no banco do veículo em movimento. Qual o segmento, próximo o momento de descer? Quem daria o lance, lançaria o laço, o seguinte lógico passo, para que permanecessem ligados? Levantando um braço, acionou o sinal sonoro, com o outro, tocando o seu outro, que, tocado, imediato, o seguiu. O ônibus parou no ponto, abriu a porta, desceram para a calçada.
Frente a frente, olhando olho no olho, apertaram as mãos apresentando-se, apreciando o que viam, além da imagem e semelhança, a bem aventurança do encontro.
Já íntimos, sem constrangimentos, sem palavras, seguiram pela calçada, conhecidos de infância, amigos de outras eras, em direção ao prédio de apartamentos, onde morava; namoravam.
Dentro do elevador, se aproximaram, perigosamente, a beira de um abismo, olhando para o fundo, um do outro, sabendo do iminente, imanente, salto sem volta, sem pára-quedas, da queda infinita a um mundo desconhecido, inevitável, imponderável, ímpar.
As bocas abertas, numa tentativa de sugar o ar que faltava, dado o inusitado da situação, do coração em descompassada disparada, não estavam preparadas para o beijo que se seguiu, a vertigem do vazio, preenchido pelas línguas que, procurando sustento, sustância, no que faltava de entendimento verbal, buscavam, na saliva do outro, justificativas justas.
O elevador parou, apartando o par, abriu a porta, a luz acendeu, expondo o corredor vazio.
Flutuando, sentindo-se sem chão, retirando a chave do bolso, abriu a porta do quarto e sala, entraram, fechando-a atrás, deixaram fora o que foram, tinham sido, e nunca mais voltariam a ser.
Sem perder tempo, desvencilharam-se das mochilas, um retirando do outro, todas as capas, as cascas, as máscaras com que se vestiram até aquele momento, até que estivessem nus, em pelo, em pele exposta, posta a prova para a apreciação, aprovação, para provar com o tato, com a língua, com os olhos, os ouvidos, as narinas, no outro, aquilo que no corpo de cada um é motivo de orgulho, de satisfação de prazer.
E mergulharam no universo senso, sensorial, sem siso, sem tino, meninos sem malícias, multiplicando carícias, como nunca tinham feito, provocando respostas insuspeitadas, de um mundo nunca visitado, inaugurando, incitando, prenunciando incerto futuro.
Não houve castidade, os castelos ruíram, as fortificações desabaram na catarse de braços, pernas, cabeça, tronco e membros, envolvidos, revolvidos, revirados ao avesso, de revés, de quina, de quatro, catapultados a uma categoria caótica, onde dois noviços descobrem serem cátedras, categóricos, daquilo que sempre quiseram sentir.
Vertendo líquidos por todos os poros, lambuzaram-se, lamberam-se, beberam-se, famintos de uma sede desconhecida, legítima lembrança nevoenta, avoenta, de um tempo perdido, metamorfoseando-se, neutralizando-se, anulando-se, convertendo-se, consagrando-se progenitores da raça de dois novos seres, outros, eles mesmos, íntegros, inteiros, verdadeiros.
Exauridos, extenuados, exultantes, em êxtase, ...eza., tombados, adormeceram abraçados.






IGUAIS




Essa estória aconteceu no tempo em que ele era apenas um garotão, cheio de sonhos, planos, decisões, um mundo a conquistar, fazendo o quinto período da faculdade de administração, à noite, trabalhando durante o dia numa multinacional como auxiliar administrativo, e não tinha tempo de encontrar ninguém para ter um relacionamento, vivia de casa para o trabalho, a faculdade de volta à casa, estudava em todo o momento livre, queria progredir, subir na vida, ser alguém, tudo o que ganhava, economizava.
Para voltar para casa, depois das aulas, tomava um ônibus. Vinte e duas e quarenta e cinco. O estômago, roído, ruindo, ruinado, roncando, reclamando. Dois estudantes mais no ponto. Veio o ônibus. Subiu, pagou ao trocador, só um banco vago. Nele, um cara, inacreditável, a mesma cara. Era ele sentado ali. Igual a ele. Um sósia. Um outro ele, como ele mesmo nunca tinha se visto.
Recostada a cabeça, no encosto do banco, de olhos fechados, segurando uma mochila no colo, dormitava.
Quando sentou, o outro se movimentou, encolheu, ajeitando-se no banco, deixando livre o espaço, que a ele cabia.
Ao acomodar-se, uma forte corrente elétrica percorreu os corpos. Colaram, como siameses. Quem olhasse de frente, diria: gêmeos, idênticos. Mas não eram, não se conheciam, nunca se tinham visto.
Surpreendido, o outro, despertado, pondo-se em atenção, virou o rosto olhando-o nos olhos, como no espelho, a imagem que viram era a de todo dia ao escovar os dentes, pentear o cabelo, fazer a barba, a cor, a forma do rosto a mesma fôrma, sem tirar nem pôr.
Quem é você? Perguntaram-se sem perguntar. Sem poder responder.
Voltaram a olhar para a frente, encabulados, surpreendidos, aturdidos, atônitos, incrédulos, do que os sentidos tinham visto, vistoriando pôr dentro dos olhos fechados, a surpresa de se enxergar sentado ao lado no banco do coletivo.
Sem coragem de voltar a encarar cara a cara, ficaram calados, colados, grudados lado a lado. Mas o corpo, reagindo, sentido a inevitabilidade do encontro, se encontrava, com faíscas de eletricidade estática, ondas de calor, indo e voltando de um para outro, não os deixando negar que a perturbadora proximidade os fazia vibrar em uníssono, deixando-os submissos aos sentidos.
As narinas dilatadas, como animais em estado de alerta, o pelo eriçado, pressentindo o perigo, farejando um ao outro, medindo intenções, avaliando, considerando movimentos, prontos ao ataque.
Sem se dar conta, contato, um toque, tato, mão na mão, um esbarrão. Uma forte ereção. Situação inusitada, nunca antecipada, jamais imaginada. Outra olhada, encabulada, encantada. Que fazer na situação, a ereção, a atração? Se ver no outro, sentir-se fundindo-se ao outro, por todos os poros, as moléculas girando em ondas, de infinitas idas e voltas, vórtices de energia tornando-os um só, sentados lado a lado no banco do veículo em movimento. Qual o segmento, próximo o momento de descer? Quem daria o lance, lançaria o laço, o seguinte lógico passo, para que permanecessem ligados? Levantando um braço, acionou o sinal sonoro, com o outro, tocando o seu outro, que, tocado, imediato, o seguiu. O ônibus parou no ponto, abriu a porta, desceram para a calçada.
Frente a frente, olhando olho no olho, apertaram as mãos apresentando-se, apreciando o que viam, além da imagem e semelhança, a bem aventurança do encontro.
Já íntimos, sem constrangimentos, sem palavras, seguiram pela calçada, conhecidos de infância, amigos de outras eras, em direção ao prédio de apartamentos, onde morava; namoravam.
Dentro do elevador, se aproximaram, perigosamente, a beira de um abismo, olhando para o fundo, um do outro, sabendo do iminente, imanente, salto sem volta, sem pára-quedas, da queda infinita a um mundo desconhecido, inevitável, imponderável, ímpar.
As bocas abertas, numa tentativa de sugar o ar que faltava, dado o inusitado da situação, do coração em descompassada disparada, não estavam preparadas para o beijo que se seguiu, a vertigem do vazio, preenchido pelas línguas que, procurando sustento, sustância, no que faltava de entendimento verbal, buscavam, na saliva do outro, justificativas justas.
O elevador parou, apartando o par, abriu a porta, a luz acendeu, expondo o corredor vazio.
Flutuando, sentindo-se sem chão, retirando a chave do bolso, abriu a porta do quarto e sala, entraram, fechando-a atrás, deixaram fora o que foram, tinham sido, e nunca mais voltariam a ser.
Sem perder tempo, desvencilharam-se das mochilas, um retirando do outro, todas as capas, as cascas, as máscaras com que se vestiram até aquele momento, até que estivessem nus, em pelo, em pele exposta, posta a prova para a apreciação, aprovação, para provar com o tato, com a língua, com os olhos, os ouvidos, as narinas, no outro, aquilo que no corpo de cada um é motivo de orgulho, de satisfação de prazer.
E mergulharam no universo senso, sensorial, sem siso, sem tino, meninos sem malícias, multiplicando carícias, como nunca tinham feito, provocando respostas insuspeitadas, de um mundo nunca visitado, inaugurando, incitando, prenunciando incerto futuro.
Não houve castidade, os castelos ruíram, as fortificações desabaram na catarse de braços, pernas, cabeça, tronco e membros, envolvidos, revolvidos, revirados ao avesso, de revés, de quina, de quatro, catapultados a uma categoria caótica, onde dois noviços descobrem serem cátedras, categóricos, daquilo que sempre quiseram sentir.
Vertendo líquidos por todos os poros, lambuzaram-se, lamberam-se, beberam-se, famintos de uma sede desconhecida, legítima lembrança nevoenta, avoenta, de um tempo perdido, metamorfoseando-se, neutralizando-se, anulando-se, convertendo-se, consagrando-se progenitores da raça de dois novos seres, outros, eles mesmos, íntegros, inteiros, verdadeiros.
Exauridos, extenuados, exultantes, em êxtase, ...eza., tombados, adormeceram abraçados.

terça-feira, 1 de setembro de 2009

OS CARAS





Se gostar de mim
Inclua meus pêlos
Os mazêlos
O zelo para ter nos bolsos algum
Quase nenhum futum
Um dedo pra partir pra dentro
Comer sem coentro
Degustar Contreau de leve
Ser breve nas bravatas
Não apertar o nó da gravata
Rei das aventuras
Entender os nós das costuras
Aturar tirania
Valentia pra rir dos desmandos
Abraçar quando mando

Dando sem pedir
Dirá versos
Virará o universo
Varará a noite
Oitentaremos juntos
Ou faremos muitos
Tantos quantos
O caminho cruzar
Avessaremos a vida
Sempre de partida
Ida sem volta
Volta e meia
Arteiros
Inteiros
Seremos
Serenos
Nossos
Sós
Nós
Os caras!
Meu caro!

sábado, 29 de agosto de 2009

QUERELLE



Nosso propósito não é fazer aparecer dois ou mais personagens – ou heróis, pois são extraídos de um domínio fabuloso, quero dizer saídos da fábula e do limbo - sistematicamente odiosos. Mas, antes, que se queira considerar que seguimos uma aventura que se desenrola em nós mesmos, na região mais profunda, mais associal de nossa alma; então, é pôr animar suas criaturas – e de propósito assumir o peso do pecado deste mundo nascido dele – que o criador liberta, salva sua criatura, e com isto se coloca além ou acima do pecado. Que ele escape ao pecado, e que ao mesmo tempo o leitor, pôr sua função e pôr nosso verbo, descubra esses heróis até então apodrecendo em si mesmo....

Querelle! Todos os Querelle da Marinha de Guerra! Belos marinheiros, vocês tem a doçura da aveia doida. JEAN GENET

segunda-feira, 17 de agosto de 2009

ENCONTRO




I Ato

Aquela hora da madrugada, quando os vampiros vagam soltos, voejando sem destino, em desatino e, é questão de instantes, antes que os primeiros raios de sol os torne pó, já que a sede, secado aos limites o sangue, vital às veias, só um ser, jovem, vibrante de pulsante e saudável energia, poderá aplacar, fome de criatura, residente a eras na escuridão do desamor, largado lá, ferido, por um frio e insensível franco atirador, tornando-o resistente, mas refratário a aproximação, servindo-se só do propósito a que se prestam, se prestassem, pagando em igual moeda o que o corpo alude, avalanche, amiúde, assim, feito lobo uiva, faminto de vida fresca, na madrugada gelada, varrendo ventos vazantes e, ao virar a vau na avenida, viu, de pronto, no ponto, fanicando, falena figura, farfalhando, assoprando as mãos, numa tentativa de aquecê-las, esquecida em si, resvalando de um pé ao outro, revelando um balé ralentado, tratando com a transfusão de dirimir a inversão térmica, traduzida aos intragáveis três graus centígrados.
Atento a qualquer nave, quase ave, quase na neve, aventados corredores congelantes, reino ruminante, razoável à rapina àquela hora, sorriu, quando, estancado veículo, aberto o vidro por dispositivo, seu tripulante, ativo, tramou como intróito:
- Quer uma carruagem, ou quem sabe um trago da minha beberagem?
Voragem visionária, sem trastejar, tratou de entrar no bólido ígneo, fumarento da flamejante travessia da estratosfera terrestre, sem travar nada, nem sequer esperar um segundo aceno.
Selada e lacrada a porta partiram e, o cálido interior acolheu-os. Estendendo a mão quente, ao contato da nua, crua , quase pedra, num augúrio, inquiriu:
- Chamas aqueçam teu nome. O que danças na rua, lanças para a lua?
- Tudo está refeito agora, o que será, seremos! Porque o frio insana. E, além do legítimo, partido de você, nada de mal serei, será íntimo, não é?
- É a mais pura vaidade, a vocação é fazer bem, mas espero resultantes; estamos acordados? Sei que nada é desgraça, quando se está na praça, diga o preço!
- Mereço saber que não preciso me desandar em descobrir qual a gravidade do efeito dispensado, adentrar em desatino num covil sem aludir ao destino. Eu realmente entrego minha viagem em direção a sua vivaz virtude. A partir deste lamento, não me faça sofrer revés, não te acusarei de aborrecimentos e nem o farei clamar intento, prometo.
- Louvo seu alento, mas não são, deveras, promessas sérias demais, derramadas para quem acabou de aportar?
- Atente ao meu parecer, porque se não for assim, perderei seu caminho, e nosso tempo, para mim é assim ou vaga, veja-me, sou de uma só lavra e, já tendo entronado outra vez, sonho em adentrar quem seja como eu sem estragar meu coração.
- Eu não prometo que esqueças o que bebeu, mas já que estamos nos sabendo, como a serpente o ovo, também quero compactuar com a idade, olhe para mim, note as marcas do vento no meu gosto e os sabores que a vida me cansou. Jurei que não mais lavaria a loucura, me atirando ao sério, mas a avenida é recheada de reviravoltas e na quina da retorta te topo, então deixe que eu lude a ida e tu a lida alude.
- Lancei a linha no lago, feito criança, mas se sei levar o brinquedo, o sério seria pescar desta beira, trocando, te dou a isca e você, feito peixe, engole, assim ficaremos fisgados e como num rio remansado, navegaremos ao calor.
- Seja para o que for, pode contar carneirinhos, serei pastor incondicional.
- Leal compartirei, já que o legado está legitimado, podemos lavrar nossa missiva, lançando-a ao infinito.
- Sem isso ou daquilo, só um prelúdio, um acerto de desvãos, cujas prerrogativas são mais rentes, sem pressa, presa, preme que chegues perto, quero ser seu valor.
- Vamos fazer melhor, que seja lírico, como já o sinto onírico.
- Convocação aceita, estamos quase varando.
Vazando velhos sinais, deixados para trás, quais nocivas novenas, avistam a altíssima torre, plantada em descampado, ornado de espécies esparsas, raras, e rarefeita iluminação, vacuado das vielas por vasto vazio, se abre à aproximação, a goela do subterrâneo.
Sucedâneo, digitalisada a senha, elevam-se, sem tangimentos fúteis, calam-se num enleio, resvalados no ensejo, sem mais vazas, que aquelas, as que seus corpos crentes urgem e, caminhos sinceros, incisam relevar.
Como numa bolha, solta no espaço, a vista, vagando no ar, abre-se inteira sobre as luzes, apagando-se no clarear do longínquo horizonte, mistura de céu e mar.
- Sem outra intenção, senão quebrar o gelo, ou puro apelo, posso te oferecer uma soda à moda, ou outra vertigem que nos esqueça do frio, das anteriores noites solteiras.
- Inteiras viagens, menos visagens, porque prefiro saber na saliva da língua a doçura das tuas lavas e o suor vertido sal no sexo que seremos, preenchendo os rios lavrados, para que sejam bordados por mim, tal rei de um reino urdido a lanço que, diferente dos carteados por fadas, lilázes para gente, será aparvoado por hóstias fantásticas e miraculosas, como todos deveriam, serenos.
- Ser preso da surpresa, sem haver pensado nisso vindo teso despencado desta ladeira, é a maneira que seguiremos, sem escolta, nem quebrarmos a verdade dita, atingindo ditosos os azuis dos dias bem aventurados a serem digredidos.
- Idos tempos tristes. Dispamos agora as vestes vestais, até que estejamos nus dos corpóreos véus, diante do vexame de sermos verdade, essência do que somos.
- Que então não hajam mais barreiras, sombras, manchas, do antes ou d’aprés midi, que impeçam de que sejamos ligeiros, diretos, leves, seres imaginosos, com o todo comungado.
- Amar na luz deste novo amanhecer, sei que é o que queremos, porisso compactuo com tamanha intimidade e calma, que saibamos, somente nós.
- Vamos vazar, sinta a tez.
Abraçados, enlevados, sentindo-se além dos laços do outro, lançam, para a vida, para o dia, por estarem acordados, ensejos de que o mundo todo desperte entre bocejos e beijos, com a mesma predisposição predita.
- Louvar gloriosa manhã raiada.
- Bendito o vento que vestimos anterior a estarmos conclusos para o encontro.
- Hosana dias que virão!

II Ato

Soado o intercomunicador, repetido, repartindo o desenrolar encantado, truncando a cena.
Acenado que era provérbio proveniente do próprio, zunindo de dentro da bolsa, próvido, replicou, alheiando presença.
- Não pense que, porque estou te escutando, vou volitar, por favor, esqueça que me pertenceu, se por acaso passar por mim na lua, finja que não me riu, não terei nenhum lazer em latir para você, acabou, você perdeu, eu te estranhei, atirei fora o número da tua fraca intenção e doei a venda da cegueira que te manteve, cão guia, atrelado a mim. Você agora é lêndea.
Prestidigitando o aparelho, prismando-o à parte, disse:
- Desentenda o que ouviu, decomponha só o vogar volante do meu coração corisco.
Arisco momentâneo, mas logo amansado por olhos amorosos, exibe sua juventude, justa, sem velos, a mente sã, talhada, trabalhada à ferros, expondo escultural máscula musculatura, construída, bem distribuída, de protuberâncias e reentrâncias exatas, proporcionalidades perfeitas, gestos concretos, viris, gentis, graves, de suave graça, perfeito vôo de garça, volta a pousar para repousar esgarçado no sofá, assistindo juntos, jactantes, o espectaculoso raiar do sábado, vindo em cores extravasado.

III Ato


Cravado o dia ao meio, banhados, descansados, descontraídos, saem para ceiar, conduzindo, muito a vontade, a fome da crua verdade.
Na Liberdade, linda beldade, vestida de vistoso quimono sedoso e rasgados olhos orientais, orienta-os a entrarem, excluídos os sapatos, reservados, separado-os dos demais, por corrediços painéis de papel de arroz e madeira.
Abandonados, esquecidos ao largo, largados por sobre almofadas, as pernas tramadas, cozidos no ato num fogareiro forte, comem-se sobremesa, exotisses, com pauzinhos, feito porcos, frangos, filés, pimentões, amendoins, molhando-se agridoces, bebendo-se saquê, sacanas, sagazes, pegando-se os pedaços, alcançado às bocas suculentos legumes, raízes resvaladas, revelados saboreiam-se, comprazem-se lhes escapando nacos, deleitam-se na inaptidão tratada a tais talheres, regalados rompem em risadas, saciados jazem lassos.

IV Ato

Vão visitar o vestiário e valorar vestes válidas à vida vindoura.
Leves como anjos, descidos recém a Terra, descobrindo os haveres, os prazeres de ser gente, misturam-se aos passantes, antes, roçando, livres, ao largo das convenções, das conveniências, administrando a sapiência dos que tem a consciência leviana e a gratidão, por aptidões adquiridas, no acúmulo das experiências, provenientes de existências anteriores, sem serem pedantes ou redundantes nos atos e palavras proferidas aos ouvidos, sem cuidado, dos desavisados incautos, autos de fé no porvir, atos sutis como plumas ao vento, de vaga lembrança, mas levados como fiança de que a aliança com o divino está presente e, só a passagem, mítica, dos seres, lhes diz que tudo vale, mesmo que cale pouco fundo, distraídos no conturbado mundo do dia a dia, fia tecido tênue entre o visível e o que não se sabe se existe, mas persiste nalgum canto da memória, fiapos da retórica sussurrada, levada para casa como jóia de inestimável valor, porque imperceptível, guardada num pedacinho, reservado somente para preciosidades, do peito dos humanos.

V Ato

Escorregam de volta à bolha, felizes como esperanças, vertendo crianças de todos os porões.
Tão perto sabem-se, que jubilam-se em compactuar.
Acendem velas, incensos, banham-se demoradamente, alimentam-se de leves iguarias, inebriados de licores tingem-se cores, envidados, internam-se num mundo senso, tocados das peles transformadas em sedas, pérolas, particulares especiarias, adamascados veludos, profundos oceanos de marinhos seres abissais singrando aquáticas maciez de escarpelar às unhas alturas aéreas distendendo asas dilatadas miríficas, meeiros de mesma miragem, voragem de internarem-se inteiramente orgânicos em mundos orgiáticos, profanos, proficientes de margens tangíveis apenas pela imaginação cambiante do volátil aprofundar vigoroso em mina minerval escorrendo lava vulcânica, orgástica urgência de eras de gestação no núcleo incandescente, indecentes, desejosos de dar ao outro o melhor, orgulhosos mergulham-se e emergem eminentes.
- Estou inteiro, mas partido o id, o self, posso perder o prumo, os sonhos se contemplam, revalidos.
- Tome minhas mãos e firme a vazante do instante, assim ele se eternizará no trono da revoada de riquezas revistas.
- Monarcas migratórias passeiam, hóspedes, pelos quadrantes dos nossos mapas astrológicos.
- Loucos hunos invadiram a lógica do céu dos crentes, sem misericórdia.
- Medra em mim milagre mirabolante, a ser compartido como o pão do sacrifício.
- Oréade bosqueia flores ordinárias, na opulência montanhosa do meu peito, para ofertar-te reverente.
- Gema essencial dos meus versos, âmago do mais puro, congela o fogo desta vela e desvela a rima.
- Encastoado em casulo encantado o reverso é versátil ao câmbio e se apronta nubente ao nirvana.
- Nuanças macias perpassam a nulidade dos sentidos, faleço.
- Legitimemos o chamado, adiantada hora, deixemos o limbo investir épico, durmamos.
- Amém, Amor, Amém!

quarta-feira, 12 de agosto de 2009

TRAMAS DO CORAÇÃO



O preço do sucesso é talvez a solidão, Sílvio pensa, pondo para encher a banheira de hidromassagem ouvindo as mensagens na secretária eletrônica liga o laptop para saber a agenda do dia seguinte seguindo o ritual noturno arranja sobre a mesa de vidro a carreira do pó branco que ao aspirar lhe trás o alento na carreira corrida jogando as roupas pelo caminho levando copo com dose de whisky interna-se na


espuma borbulhante deixando que a água o acolha maternal calorosa sentindo-se abraçado cortejado cai em delírio de desejos de ser amado ser tocado por lábios e mãos habilidosas apalpando-se com a própria mão vai dando vazão ao tesão que parece lhe devorar o corpo cansado sedento da vontade de internar-se em outro corpo capaz de varar a madrugada sem sair de dentro tal o voraz vazio instaurado instalado indelével indestrutível mesmo por todas as bajulações das profissões a de ator e de boy de programa programado para dar satisfação ao cliente seja ele quem for forçando a mão verte na água o conteúdo acumulado no dia dando por encerrada a sessão sai da banheira enrolando-se na toalha macia seca-se joga-a ao chão enfia-se no roupão rompante retira-o atirando de bruços na cama a pujança o vigor o tônus a alternância de curvas e saliências reentâncias sombreadas e luzes dourando a pele nua do corpo exausto, adormece.

sexta-feira, 7 de agosto de 2009

ELEVADOR



Poderia ser Tóquio, Nova York ou talvez, porque a lua atingira seu plenilúnio, seria noite de equinócio, ainda uma tal, ou, total, conjunção astral, quem vai saber, sincronicidade ou, simplesmente coisas da cidade, a pressa da hora do rush meteu-os juntos no elevador, na descida, trinta e sete andares, o aperto os colocou encostados, contra o fundo, colados, calados, não tiveram como ir contra o contato e, sem querer, sem pensar, a ereção veio forte, fazendo cara de paisagem, ovelha no cercado, contidos por todos os costados, só constam as manobras, as mãos à obra, disposta intenção para sentir do membro a pulsação e, pelo tato, parece de fato um grande falo, falando por si, apontado para o alto, apertado nas pregas, fugindo as regras, querendo romper tudo, sair tesudo e encontrar o caminho do prazer, certos de serem delatados se flagrados mas, que situação, dar ciência ao outro da anuência, da conivência, diante dos fatos, ir a favor, ninguém mais cabe, nada a fora fala, suspensos, supressos, espremidos, contidos, todos na ânsia de que a viagem seja breve, brecados na jornada ao conhecido caminho ao lar, como gado, imprensados no brete, mas enquanto isso, omissos dos compromissos vindouros, ouro de encontro, confronto caloroso, quente, gostoso, cheiroso, o corte do cabelo na nuca à mostra dando ganas de lamber, de meter o dente na orelha, vista assim por de trás, trás à ponta da língua saliva e silentes sílabas a serem sussurradas, obscenidades, sacanagens a serem vivenciadas, viris verdades brotando ingênuas à mente, frementes, indiferentes ao abrir e fechar entre andares, próximos demais para desperdiçar o atiçado facho, o fetiche da gola da camisa engravatada, o paletó, de corte justo, evidenciando os ombros largos, o perfume suave de madeiras liberando labaredas para o fogo que os faz vibrar em uníssono, submissos a imperiosa atração que os cola, mela, enrijece e ao mesmo tempo amolece as pernas, permanece mistério, de que minério será feito o outro, ouro, aço e, o que faço, que rosto terá, o hálito, qual o gosto, logos à parte, o logo, a imperiosa premência de se terem, a urgência fazendo o corpo calcar partes vitais, válidas à demência de se tomarem ali mesmo, no ato, atacar com tudo, tomar de assalto, chamar alto, pressionar o peito, colar a boca na boca, engolir a língua, beber a saliva, nada alivia, silva, sua, clama a alma alterada, a deflagrada pólvora que em polvorosa os incendeia permeia a loucura e, o elevador, acionado em todos os andares a parar e continuar, sem fim, sem tréguas, sem guarida a desabrida intenção de meter a mão a dentro, dar asas ao desejo, seguir o ensejo, ficar frente a frente, enfrentar cara a cara e deixar que encarem as gentes, pendentes, que ali vão dois que não conseguem conter a fúria, que em chamas abrem-se em chagas, chamam-se os corpos fogosos, fragosos, de difícil escarpa, contém-se a custo, a contragosto engolem o desgosto de não poderem se possuir, nem se permitirem meter-se a dentro, darem-se ao desfrute de comer o fruto do gosto de serem ali mesmo unha e carne, em carne viva, clamando calma a todos os poros, pedem muda clemência, paciência, pois o elevador está chegando ao térreo, a férrea ereção precisa ser contida, para que cabida na situação, sitiada, situe os dois dentro do cabível, o aceitável, e que acatem a espera, cabais, que chegará a hora em que a fera irá a forra, ao meter-se à fora, abertas as portas, acorrem ao lobby, livres, ao largo, largados no saguão, sem hesitar, dão-se as mãos, sabem o que querem, o êxito, exultantes saem a rua, em acordo tácito, metem-se juntos dentro de um táxi, tomam um rumo, rimam o verbo amar.

domingo, 19 de julho de 2009

sábado, 18 de julho de 2009

DOMINGO



Da varanda do loft no décimo andar, viu espraiada a movimentação do Domingo na areia, chamando, berrando sol, cerveja, mar, quem sabe o que mais, talvez seja o dia de encontrar um amor.
A paisagem estava ali há já imemoriais eras, mas era o primeiro assim com tudo em cima, por cima, zunindo no lugar, luzindo a novo, a ser inaugurado, apartamento, praia, ele, tudo tinindo, pronto, vida nova.
Vendo assim em ótica de ânimo disposto, ânima refeita de refregas passadas, lavadas no sal das vertidas lágrimas, labuta árdua esquecer e reerguer dos escombros os ombros sobrecarregados, levantar as vigas, os pilares do que agora está pronto para viver em plenitude, cheio de atitude, fechada a porta do apartamento e acionado o elevador se vê de corpo inteiro no espelho do hall, nada mal, pensa, 35, sarado, solteiro, os cabelos no lugar, os poucos pêlos pelo corpo, o protetor no bronzeado leve, a bermuda surf, a camiseta no tom, a sandália, todo bom, conclui.
A porta do elevador abriu, entrou, inspecionando no reflexo triplicado nas espelhadas paredes o cara refletido, parado na dele, se reconhece outro, ele mesmo renascido, revivido, revisto em primeira vez, estranho benvindo aos olhos que o vêem.
O elevador para, abre a porta, entra um garoto, prováveis 25, vestindo mesmo estilo, cumprimenta como conhecido.
- Você é o novo morador do prédio, diz afirmando, eu o vi algumas vezes durante as obras lá em cima. Fui algumas vezes lá, falei com os operários, conheço um pouco do seu apartamento, antes de ficar pronto. É um loft, né? Tenho curiosidade de vê-lo agora que está concluído. Eu me interesso pôr arquitetura, estou fazendo a faculdade. Eu sou Lauro, e vc?
- Dante. Sou advogado. Terei prazer em mostrar como ficou a reforma. Você vai a praia aqui em frente?
-Vou sim, fiquei de encontrar com uns amigos, mas podemos marcar pra quando você puder.

Diante de tanta cordialidade, não há aí nenhuma insinuação, só camaradagem, uma abordagem coloquial, um modo de passar o tempo durante a viagem, nem passa pelas idéias as idéias que o autor da história prepara para eles. Mas não vamos antecipar os lances, por mais que o leitor alcance e preveja o enredo, não subestime a capacidade que as pessoas tem de surpreender ou mesmo de serem surpreendidas pelo inusitado com que as nuanças se precipitam, se apresentam ou nos tentam quando menos se espera e nem se pensa nisto.

A claridade da calçada ofuscou a miragem que instantes antes deles se apossara, mesmo que nem tivessem em conta, estavam encantados. Tinham esta faculdade, a sensibilidade apurada.
Atravessaram as pistas lado a lado, pisaram na areia quente com o mesmo pé.
- Olhe lá meus amigos, venha que vou te apresentar a eles. Você joga futvolei?
Apresentados, todos bem apessoados, aficionados formam uma roda a trocarem passes, lançando a bola.
Bolados, os dois, bolem na imaginação, um do outro, imagens antes não pensadas, vindo avassaladas, sendo invadidos de uma forte atração exercendo seu poder, apoderada, sem ponderação nem meio termo, internada.
Mareados com a onda, se jogam no mar, atravessam ondas, ondeiam ares de que não se importam mas, uma porta se abrira, aportaram a beira de um precipício, o início vertiginoso de uma viagem sem volta.
Voltam a camaradagem, freqüentam uma roda de capoeira formada na areia, batendo palmas rodeiam-se, enredam-se, ensaiam passos da dança-luta, leveza de força bruta, magnetismo animal margeando os movimentos graciosos, olhos nos olhos, avanço e recuo, musculaturas túrgidas, lentos, rápidos, ríspidos, retaliação de parte a parte, avaliação, revelam-se mestres na arte, saltam, dão pernadas, rasteiras, se exibem, abrem a roda, rodam gingando, girando, bambeando, bambas cedem a vez a outros camaradas.
Sem mais noção de continuação, negando o inusitado agindo descontrolado, deslocados, voltam à água, mergulham, saem rebrilhados, luzidios, respingando ouro puro param ao sol, solícitos de pensamentos lícitos, válidos ao momento, vasculham o entorno, concordam com coco, bebem a água, se apresenta um oco, devolvem as cascas sem comer a polpa, em palpos, translúcidos se enxergam pelados, expostos, postos a nu aos olhos do outro, transitivos transitam, transladam olhando para os lados, ao longe, procuram situar o sentido, evitam o olhar, alheiam-se, ausentes dizem tchau, até mais, tocando as mãos, passa lá e, aos amigos, até mais, valeu o voleio!
De volta ao prédio, perdido dentro do elevador, sozinho, dando tratos à bola diante do ocorrido, Dante analisa, sem lhe acorrer socorro no que parece estar vindo em sua direção, uma aberração, uma ereção, um tesão na intenção do que parece ser errado, o lado obscuro, o que nunca tinha agido nele, nunca fora por ele, não sabia explicar o que não tinha aplicação prática, nem em sonhos se vira atraído ou atracado com outro macho e acho que este papo tem que se encerrar por aqui, e ponto.
De pronto o elevador de serviço pelo qual subira abriu a porta no seu andar, e nem bem ele começou a andar em direção a porta ouviu o interfone estridulado chamando. Abriu, entrou, fechou, atendeu. É Lauro, posso subir? Dormente, estremece, fremente permanece uma fração fora do ar, arfa, falta o ar, some o chão, só consegue sussurrar, sim.
Fibras afloradas olha à roda, roda ébrio pelo salão, sai bicando quinas, pesquisa gavetas a procura de achar algo, busca o quê possa estar fora do lugar, ter em que se segurar, atônito, em transe entre o que sabe e o que poderia ser que viesse acontecer, que pode ser só fantasia, ri sem saber de que, escolhe um cd entre tantos, a esmo, a música enche o ar, arde de uma febre desconhecida, sua, sai à varanda, vara com o olhar o mover na praia e tudo paira parado boiando em suspensão, súbita a campainha sibila, vai abrir em suspense, tenso, suspenso com as suspeitas e, seduzido não dá outra, atração e reação, mão na mão se puxam, ato contínuo, de cara atracam-se sem pejos num beijo de querer entrar casa a dentro, adentrando a vida, o corpo, a morada da alma, a imaginação nas línguas percorrendo os céus das bocas flutuando soltas num céu claro de horizontes longínquos e distantes do que tinham sido já não mais sabem o que eram, o que foram, reflexivos, deflexivos são agora o que deflora, deflagrados nas mãos do outro, músculos, másculos, ásperos, rudes arrancam bermudas e cuecas úmidas em arroubo, rentes peles com areia arranhando as línguas salgadas de mar e suor, selvagem voragem de querer se internar, alternando-se beijam lambendo roçando, descobrindo vertentes, várzeas, vasas, asas abertas para desbravar segredos revelados nos recuos arrepiados, nos gemidos incontidos, incontáveis toques refletidos, tal luta de titãs, tratando sem dó a vergonha de entregar ao outro o prazer que quer pra si, sendo o outro, se atrevendo em ser o macho, a fêmea, famintos, com a fome dos sem nome, os sem teto, tateando limam-se no limbo, levitados, enlevados, levados além do que sabem se chamam pra briga, abrigando amigos a desbragada tesão, resvalando nos escorregadios limites do conhecido, reconhecidos iguais dão-se pôr inteiro, se entregam, ganham-se, metem-se a dentro, mesmo que doa, doam-se de parte a parte, artes de mestres, artífices, arietes em riste, arteiros ardem num fogo que nunca experimentaram, apimentam o que tem domínio, demoram-se em momentos de experts, espertos apertam, apressam, premem, se presam caça e caçador se prezam, percutem, recuam, refutam, refregam, esfregam, esfolam, forçam, forcejam, resfolegam, rolam, enrolam-se, roncam, rompem-se amorais, imolam-se imorais, amorosos, demorados vazam, extravasados gozam em eco.

Escurecera, o dia virara noite, anoitecera, nem se deram conta do que sucedera, sucumbidos ficaram deitados, contando dedos, catalogando dados significativos, indicativos caminhos traçados com mágicas linhas sobre as peles, apelando para os trânsitos nos quais seus mapas astrológicos tropeça, o que se passou, perpassado e não há nada além dali, deles, neles, o mundo inteiro é agora ali, em seus corpos acalmados, acasalados, acastelados nos braços acamados sobre o macio tapete felpudo, mansas falas, as salas de suas mentes planando acima do bem e do mal, mal levando em consideração o fato de ser a primeira vez dos dois, se disseram, constrangidos ao ato de terem reagido ao impulso do pulso do momento imperioso, mas que orgulhosos, agora, sentem pleno entendimento e que tem conhecimento de ser aquilo mesmo que querem, que é o que sempre quiseram encontrar, mesmo sem saber de antemão e mesmo que vá na contramão da lógica vigente, sentem, sabem, isto é amor que, sem contrato, concordam, é pra ser levado de fato, adiante, a durar, a dois.

domingo, 12 de julho de 2009

NA ACADEMIA



Se encontram na academia como se ajustados os fusos horários, armadas as mesmas séries, sérios, alternam-se nos aparelhos, dividido-os a intervalos e, sem resvalos, criada a cumplicidade, um auxilia o outro com os ferros, ferrando-os com mais pesos, alçando-os para alcançar ao outro os halteres.
Exibem na frente do espelho as formas que se avolumam em bíceps, deltóides, os grandes peitorais, o reto anterior do abdome.
Sem deixar que o outro perceba, olham-se, a espelharem no outro a construção do físico que querem para si, se parecem, assemelham espartanos, atlantes, extasiam-se mutuamente pôr breves instantes, competentes complementos competem calados, aliás, poucas palavras trocam, provocam reações.
Chegam em automóveis novos, potentes, reluzentes, orgulham-se de suas máquinas, símbolos de seus sucessos, deixam-nos no estacionamento, saindo deles clicando os controles remotos, vestidos nos seus ternos bem cortados, sóbrios, solenes, trazendo na mão uma mochila, o que toa como um toque de aventura.
No vestiário despem-se, ritualísticamente, lentos, ao som da voz de Mick Jaegger cantando Anybody seen my baby?, trocando a capa da formalidade pelo jovial esportista, modernos, antenados com seu tempo, contemporâneos.
Nos aparelhos, compenetrados, cientes da ciência que professam, suam, gemem, bufam, arfam, torcem, empurram, puxam, num esforço voluntário de construir um perfil másculo, viril.
Conhecem já os corpos opostos, exposta cada curva, a volumetria, a simetria das formas, os pêlos, os cheiros, os sons.
Parecem ser tímidos mas, são éticos, áticos.
Atiçados pelo outro, atinam-se, atem-se em conjecturas, em suas costuras alinhavam um atilado retrato do que se atrevem entrever no que o outro transborda mesmo não querendo invadir a intimidade alheia, admiram-se.
Silentes, on the shower, (to lather side by side) ensaboam-se lado a lado, deixando a água, abundante, espumante, escorrer pelas peles, entrefechando os olhos, como se não vendo, abrem-se num show, exibição para a visitação ( top, top secret, only for your eyes) dos olhos do outro, demorando-se, derramando-se em esmeros, acrescentando temperos, para o destempero, o desespero do outro, já entrando em transe, transido, tremente, temente de que o outro perceba e vexado se evada, já vazando, extravasando o vigor acumulado, dada a urgência grunhe engolido pedido de clemência por não ter podido evitar, vibrando todas as fibras, na fímbria.
No vestiário, espalham pelo corpo generosa camada de creme hidratante, tratantes de entrar nos recônditos, recondicionando o tônus das peles plenas de juventude, atitude, intenção, atem-se aos detalhes do trato, tratam-se bem, beneficiam-se de serem bem nascidos, bem dotados, calçam-se pelo mesmo pé, cuecas, meias, camisetas, jeans, sapatos, jaquetas, como se tivessem combinado, cambiam-se para a balada.
Sabem, e nisto consiste a arte, atear o fogo, fagueiros, falseando a verdade volante de volúpia
Mesmo que desabada, desacreditada, a armadura de novos centuriões, guardiões da máscula vestidura de que são investidos, mantém a pose, posam convictos.
Ficam assim instigados, instados a futuros contatos no confronto de parte a parte.
Contidos, aspergem-se perfumes.
No estacionamento perdem-se.
Partindo, penetram a noite a procura dos prazeres permitidos.

sexta-feira, 3 de julho de 2009

A QUEDA

Solto o corpo no banco estofado em frente a mesa no bar, barra pesada, arrasado com a queda da Bolsa, deixa cair a bolsa com o inseparável lap top ao lado no banco, banca de executivo, exausto, tombando para trás, trazendo as mãos da nuca a fronte a querer rasurar os pensamentos em avalanche, antes de atinar um lance que o aprume, rume ao sucesso despencado, atirado em queda livre num bungee jump suicida, decida enquanto o celular não soe no encalço a me procurar para o cadafalso, Messias de araque, Mandrake sem mágica, arrisquei em falso, apostei em encantar serpentes, fui picado com a pica que quis meter nos outros, ao aplicar o dinheiro de outrém e que porcaria de vida agida assim no risco, no fio da navalha, canalha, supor-me Deus, Mago, e que estrago, somente um trago, uma dose de cicuta ou que vá tudo a puta que o pariu e fujo pro Hawai, um haraquiri, um Daiquiri, vida kamicaze, por um quase nada me dou bem, a fairy tale sem final feliz, foi por um triz, mais alguns dias teria meu primeiro milhão, agora tenho que me danar feito um cão coçando a sarna, sem armas serei preso, enjaulado, verei o sol nascer quadrado, arcar com o peso da responsabilidade de não ter tido a habilidade de manobrar a crise antes que ela me atingisse feito descarrilado trem bala, porque não se cala esta fala derrotista e qual é do artista, o cara sorrindo, levantando o copo em minha direção numa saudação, um brinde ao quê meu Deus, a minha derrota, que marmota é essa, rindo assim da minha desgraça, palhaço sem graça, não tá vendo que estou acabado, arrasado, um trapo estirado ao chão, só falta agora a cavalaria, a tropa de choque ou um tanque de guerra me jogarem por terra, esmagarem meu corpo, moerem meus ossos, como posso sorrir de volta, vala comum para meus restos, indigente, indigesto desgosto, só o gosto da ruína, a rua da amargura, dando largura no nó da gravata o grande gole de whisky desce frouxo, maneia os ombros, abre os botões da gola da camisa, tira o paletó, joga-o de lado, levanta o dedo em sinal de uma dose, desce de golada, galante outra vez, outra garçom!, e a vida já não parece tão sombria, sobram luzes no horizonte, vindo uma ponte, I want to piss, stand up passa trôpego rente ao cara que sorriu o brinde e esbarra-lhe o braço que leva o copo a boca virando o conteúdo na camisa engravatada, que maçada, sorry, sorri, desculpa, garçom um pano!, deixa que eu limpo!?, foi sem querer, é melhor lavar, vamos até o banheiro!, descem os dois os degraus ao subterrâneo, diz: tira a camisa!, take off while I do a piss!, enquanto tira a água do joelho, vê pelo espelho o outro vindo para o lado, olhando-o tocado, tocando-se, dar vazão ao dourado líquido com visível prazer, estendida mão a molhar no jorro quente e já mãos se tocando, trocando faíscas que o álcool logo incendeia, se puxam, se pegam, se pregam num beijo salivado, linguado, longo e logo vão percorrendo vãos, abrindo botões, caminhos de carinhos, mãos correndo velozes corpo a fora em direção a intenção do outro, fora de si, só senso, sentindo o tesão do outro, se empurram ao reservado, sem reservas se revezam em resvaladas carícias, lambidas nos mamilos, mordidas na nuca, manuseando o falo alheio, alheios ao mundo internam-se bocas, abocanham, se alternam em chupar, morder, lamber, dedos procurando ocupar vazios, visivelmente excitados não exitam em baixar as calças, as cuecas, calcando centímetros de pele, pelados apalpam-se, apoiam-se à parede, põem-se em posição, penetram-se, perdem-se em idas e vindas descontroladas, desmedidas, a medida do pênis, entrando e saindo, arfando, gemendo, dor e prazer, prazer e dor dando vazão, dominador dominado, dominado dominador, inominado fluxo e refluxo, domando a ânsia de querer preencher, ser preenchido, corrompidos laços com a realidade, na verdade rompem regras, rasgam linhas divisórias, dadivosos dançam, dão-se, avançam e recuam fronteiras, quase a beira da loucura, a cura para todos os males, males, machos se acham, acham-se, chamam-se na cincha, cingem-se danados, tomados, possuídos de tentáculos tântricos, telúricos, trogloditas, túrgidos, rígidos, rentes, rítmica variação para trompete e trombone, me come, me vara, que vara! bate na cara, cara! caralho que foda! Fode! Foda-se tudo quero o prazer. Azar de quem não faz, me dá teu beijo! Quero ser teu! Cabe no meu abraço. O que faço agora, é chegada a hora. Ora, vamos juntos! Justapõe movimentos a quase violência, a total urgência, rugem, rijos, ritmados, tensos, tesos, tesudos, totalmente intencionados se internam, se integram, se entregam, dão vazão a enorme tesão, extrapolam, extravasam, gemem, ganem, vertem! Apolos gozam! Ainda convulsos se tiram. Já avulsos, centímetros distantes, se medem, se olham ridentes, atem-se, atinam-se, sentem ter criado um vínculo, uma vírgula na vida. Vestindo-se, se vigiam a saberem a intenção, se vale só dizer um valeu, tchau, nem isso ou, por isso, vamos tomar um drink juntos, provocar um assunto que nos leve além, vem!

domingo, 28 de junho de 2009

AMOR E MORTE



O desejo do Universo visando à comunhão conduz a
Diversos tipos de sacrifícios - desejados e
Indesejados – inclusive os atos de comer e ser
Comido. Afinal, amor e morte demonstram ser forças
Muito mais entrelaçadas que a nossa cultura
Gosta de reconhecer. A recusa da morte divide a
Psique moderna. A simples presença cura a divisão
Entre amor e morte e proporciona um refúgio de paz
Criativa. O estabelecimento de laços profundos com
Outra pessoa invoca a morte quem pensávamos
Ser e o nascimento de algo novo.


Quero-te acrescido ao meu corpo
Unido como uma extensão.
Quero-te entregue a mim como um bebê, meu primo,
Agarrado, sugando no meu peito –
Tu alargas o meu campo de abundância.
Se deparasse contigo lá fora – se nos encontrássemos num
Campo -, eu transbordaria,
Eu te daria algo de beber.
Eu te abraçaria e absorveria completamente.
Ninguém ficaria acima de mim
E ninguém me menosprezaria.
Eu te conduziria e te introduziria,
Te levaria e faria entrar.
Eu me apossaria da tua vontade
E te traria gradual, progressivamente
Mais dentro ainda -
Na mansão interior de
Todas as minhas mães e avós,
No lugar onde todos os partos acontecem.
Eu transbordaria para ti em
Abundante vinho aromático,
A essência perfumada do meu espírito,
O rarefeito licor da minha intoxicação.
Eu te possuiria com vastidão,
A umidade liqüefeita das minha romãs,
O suco daqueles botões ali dentro,
Crescentes, expansivos, efervescentes.
O norte estaria debaixo da minha melhor parte;
O sul ficaria afastado,
Abraçado e esvaziado em mim:
A esquerda se submete a mim, a direita me abre de repente.
Quero sentir o caos debaixo de mim,
A prosperidade a me apertar, eternizada ali dentro.
...............
O amor que se expande e espalha
Gradual, misteriosamente, de algum lugar secreto,
Que procura dar antes de possuir
Não haverá de ser excitado de repente, sem estar ciente.
Não será aceso sem luz,
Incitado sem ter clara visão ou
Deixado nu e inflamado causando
Uma completa perda de inteligência.
Não, a não ser que as profundezas da sua base
Estejam solidamente deitadas,
Até que ele ache prazer em
Ceder e submeter-se aos desejos do amado.
...............
Tradução ampliada do Cântico dos Cânticos, 8:1 – 5


Trecho de INCONFIDÊNCIAS



Dentro da barraca, deitados lado a lado, Júlio e Rodrigo, ouvindo ainda disparados nos tímpanos os baqueados alterados dos corações bombeando o sangue e o resfolegar do ar entrando apressado pulmão a dentro, preenchendo desvairado, o que a pouco, exaltado, foi fúria, ânsia, desejo, ensejo de completar no outro o que em si sobra, tratado ao entregar em carinho um caminho que o outro alcance, lançando linhas de conduta, mesmo força bruta, coisa de homens, coisas da fome de entendimento, momentos em que perdida a cabeça, só o corpo alude, lúdico age, interage em complemento, dá alento, vai além, invade, investe, irrompe sem espera, impera, ordena, obedece, cede, sedentos bebem-se salivas, selam acordos, encordoam-se, encontrados livram limites, alargam horizontes, transpõem pontes, amontoam-se, desmontam-se, montam-se, remontam-se, mostram trilhas, tramam, tremem, tomam para si, silábicos predicados perdem precedentes, preceitos, preconceitos, avançam avassaladores lançando ao mundo o brado de independência, anuência à vida, vazados, extravasados, vogam amainados, remidos no remanso de depois do amor, largados, preguicentos, sentindo-se amados se soltam, entregues, estreitos, ligados, indeléveis, quase a nocaute, noa, navegam nuvens, vagueiam nus as almas ajustadas, emparelhadas, casadas, causa e efeito de estarem juntos, completados, silenciados se escutam, se entendem, se estendem, expandem o universo, invadem a via láctea, alcançam a beira e se lançam sem peias, porque, de mãos dadas, se sentem seguros, amparados, protegidos, privilegiados pôr estarem em acordo, despertos, parte da plenitude, sem que hajam vazas ou interstícios, interlúdio intransitivo, íntimo, introspectivo, reflexivo ao outro, não precisam de palavras que expliquem, implícitos professam progenitura possível para pró-homens, de um progresso projetado para um futuro próximo, de convivência pacífica, respeitadas as diferenças, as opções, razões de viver de acordo com sua consciência, inerentes só a si e, pôr isso mesmo, passíveis de exalarem versos de amor pôr onde passam, exaltando o belo, provando que é possível pelo exemplo, apenas sendo, sem sobras, sem sombras, ombro a ombro ladeados, igualados, irmanados numa mesma jornada, puxando pela mão outros, que porventura se atrasem, desviados nos descaminhos, validando valores, para que exaltados, exerçam plenos, direitos e deveres, ajudando a enriquecer os planos divinos, bebendo o vinho da comunhão e comendo o pão do sacrifício numa celebração benta com a sublime vida plena.

Trecho do romance Inconfidências de Zeka Viola

segunda-feira, 22 de junho de 2009

LEVE



Ele chegou leve como uma brisa de fim de tarde ardia um verão varão veio logo mostrando os atributos falando da tribo tratando de entronar na casa casando a falta de jeito com os assentos almofadados fadado a ser o que diz que é me ferra ao apontar um ferrado falo falando me chupa que a chapa tá quente como quem diz que sede me cede um copo d’água dando água na boca de tão gostoso gosta de andar nu navega a barlavento pelo apartamento com o corpo movido a barraventos vai derrubando as palmeiras da varanda varando o quarto entrando sem pedir licença nem tomar a bença criando desavença com o gato Angorá senhor do seu castelo o Costelo estirado na cama ronrona carícias se dizendo meu dono rei no seu trono me traz um agrado um bombocado desbocado desanda a falar palavrão na hora do vamovê move céus e terra abre as pernas penetra sem dó nem piedade comum a idade dá de dez a zero e nem leva em conta os berros de assim não que dói machuca chupa morde lambe assopra assa o peixe pede sopa se serve de todos os talheres bem talhado enche as colheres de olhares enviesados para o guisado bisando o mambo mastigando o jambo arrocha o chamego de vem cá meu nego paga pra vê se não dou outra traz truques na manga manja de malabares manuseia seus dotes de rapazote faz ares de quem viajou mares de abandono quase cão sem dono demora a cair no sono pede colo calor do ninho faz carinho se diz sozinho quer casar e azar de quem não acredita porque parece um bruto mas é um bruta monte de amor morre de medo de passar fome nem tem nome é uma mistura de cruz credo com arremedo de arroto e irrompeu nele


garoto roto mas caprichado pôr natureza uma beleza quase uma pintura barroca ronca um pouco diz que pôr um triz não foi a bancarrota nas barrancas dos rios da vida maldita que aprendeu a viver vazando ileso apesar de indefeso das ofensas que ouviu da puta que o pariu de onde partiu rindo pro mundo que se abriu em leque ainda moleque criado na rua rasgou todas as bandeiras beirou vários precipícios voltou aos inícios ao ser iniciado nas artes do amor ficou marrento faz como ninguém dá o alento que convém ao parceiro certeiro não só sua seta acerta o alvo mas alvo de alma inteiro se entrega me estragando pra sempre entrando em cheio no meu coração vago como vaga em quarto de pensão acostumado ao entra e sai pouco sai e pensa bem onde por a mão macia cheia de pureza ímpar parte de um corpo que age de acordo com a consciência que sabe a ciência de tudo que faz me fazendo acreditar em milagres esquecer dos vinagres vertidos dos relacionamentos anteriormente investidos vestido de menino é um homem como poucos um pouco infantil mas é justamente o que lhe aumenta o charme me chama amor me come com os olhos me lambuza de chocolate e depois late imitando cachorro brabo bobo resmunga quando não é atendido mas me entende os desejos ditoso enseja que no meu riso rasgado responda pra ele com a alegria que ainda não teve tem mil idéias de como melhorar o mundo vai fundo em tudo que faz traz pra casa um monte de bobagens aragens de rua rasga o verbo verte lágrimas nas cenas piegas prega botões caídos das camisas sociais que uso pra trabalhar trata todos de modo igual mas nada se iguala a seu beijo que é quando sinto que ele não é deste mundo que tudo nele é nobre como um vinho muito antigo e que além de lindo ele é um deus, meu Deus!