terça-feira, 29 de setembro de 2009

GENET




Diante de Robert, Nonô retomava sua verdadeira virilidade, que perdia um pouco com Querelle. Não que ele tenha adotado a alma ou os gestos de um veado, mas perto de Querelle, parando de considerar um homem que gosta de mulheres, banhava-se na atmosfera especial que sempre suscita um homem que gosta de homens. Entre eles, apenas para eles, estabelecia-se um universo (com suas leis e relações secretas, invisíveis) onde a idéia da mulher estava banida. No momento do gozo, um pouco de ternura perturbara a relação entre os dois machos - sobretudo em relação ao patrão. Ternura não é a palavra certa, mas explica melhor a mistura de gratidão em relação ao corpo de onde se tira o prazer, de doçura que nos funde quando o prazer escorre, de lassitude física, mesmo de nojo que nos afoga e alivia, que nos afunda e nos faz vagar, de tristeza enfim; e essa pobre ternura, emitida um pouco como um raio cinzento e doce, continua a alterar delicadamente os simples relacionamentos físicos entre machos. Não que estes se tornem algo que se aproxime do verdadeiro amor entre homem e mulher ou entre dois seres onde um deles é feminino; mas a ausência de mulher nesse universo obriga os dois machos a extraírem de si um pouco de feminilidade. A inventar a mulher. Não é o mais fraco ou o mais jovem, ou ainda o mais delicado que realiza melhor essa operação, e sim o mais hábil que com freqüência é o mais forte e mais velho. Uma cumplicidade une os dois homens, mas nascida da ausência da mulher, essa cumplicidade suscita a mulher que os une pela sua falta. Na relação deles, a respeito disso, nenhum fingimento, nenhuma necessidade de ser outra coisa além do que eles eram: dois machos, muito viris, que se invejam talvez, se odeiam mas não se amam.

JEAN GENET

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